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Robert Kurz

A GUERRA CONTRA OS JUDEUS

Por que a opinião pública global se volta contra Israel em meio à crise econômica

As reações políticas à guerra em Gaza mostram que o número de amigos de Israel diminui com o aumento da precariedade da sua situação militar. Ocorre um deslocamento tectônico na relação de forças. Desde sempre o Oriente Próximo foi palco não de conflitos limitados entre interesses regionais, mas de um conflito vicário, i. é, de um conflito entre atores substitutos, paradigmático e com forte carga ideológica. Na época da Guerra Fria o conflito entre Israel e a Palestina era visto como paradigma da oposição entre um imperialismo ocidental liderado pelos EUA e um campo “antiimperialista”, cuja liderança era disputada pela União Soviética e a China. A propaganda de ambos os lados ignorou aqui o duplo caráter do Estado israelense - por um lado um país moderno convencional no âmbito do mercado mundial, por outro uma resposta dos judeus à ideologia da marginalização eliminadora do antisemitismo europeu e sobretudo alemão. Subsumia-se Israel a uma constelação da política mundial, que nunca explicou cabalmente o país.

Depois do colapso do socialismo de Estado e dos “movimentos nacionais de libertação”, que tinham formulado um programa de “desenvolvimento recuperador” com base no mercado mundial, a natureza do conflito vicário sofreu uma modificação fundamental. No Oriente Próximo e além das suas fronteiras, o lugar dos regimes desenvolvimentistas laicos foi ocupado pelo assim chamado islamismo, que se revela apenas na aparência como movimento tradicionalista de cunho religioso. Na realidade ele é uma ideologia culturalista pós-moderna da crise de uma parte das elites há muito tempo ocidentalizadas nos países islâmicos que representam o potencial autoritário da pós-modernidade e absorveram o antisemitismo europeu, não-islâmico na íntegra. Nessa região, os segmentos do capital, que fracassaram no mercado mundial, declararam a guerra aos judeus como combate paradigmático à dominação ocidental. Inversamente, o imperialismo da crise ocidental, encabeçado pelos EUA, transformou o islamismo no novo inimigo principal depois de tê-lo aleitado e abastecido com armas antes, durante a Guerra Fria.

Essa nova constelação levou a confusões ideológicas de grau imprevisto. Nas regiões de crise, o neoliberalismo parecia identificar-se com a guerra da ordem mundial capitalista contra os “Estados em desagregação”; no Oriente Próximo, parecia identificar-se com Israel. Desde então, correntes neofascistas do mundo inteiro andam de mãos dadas com a “luta de resistência” islâmica de viés antisemita, embora ao mesmo tempo aticem sentimentos racistas contra migrantes dos países islâmicos. Segmentos expressivos da esquerda global também passaram a transferir sem qualquer cerimônia a glorificação do velho “antiimperialismo” aos movimentos e regimes islâmicos. Isso só pode ser caracterizado como penúria ideológica, pois o islamismo é contra tudo o que a esquerda defendeu na sua história: persegue sem clemência todo e qualquer pensamento marxista com opressão e tortura, pune o homossexualismo com a pena capital e trata as mulheres como seres de segunda categoria. A responsabilidade por isso também não deve ser atribuída a nenhuma religião tradicional, mas a uma militância de tinturas culturalistas do patriarcado capitalista, hoje em crise, que se dá a conhecer de outro modo também no Ocidente. A nada santa aliança entre o caudilhismo “socialista” de um Hugo Chávez e o islamismo representa apenas a ratificação dessa decadência ideológica no plano da política mundial, destituída de qualquer perspectiva emancipadora.

Desde a recente quebra financeira, sem precedentes na história, a constelação global está dando uma volta a mais. Agora fica claro que o colapso do socialismo de Estado e dos regimes desenvolvimentistas nacionais foi apenas o prenúncio de uma grande crise do mercado mundial. O neoliberalismo está falido e a guerra da ordem mundial capitalista não mais pode ser financiada. Nessa situação evidencia-se que Israel sempre foi apenas um peão no tabuleiro de xadrez do imperialismo da crise global. A própria administração Bush no fim passou a considerar inofensivo o programa iraniano de armamento nuclear. Os interesses dos EUA e de Israel se dissociam. Obama não dispõe mais de uma margem de atuação político-militar. A guerra islâmica contra os judeus é aceita como inevitável. Por isso os lançamentos de foguetes do Hamas sobre a população civil israelense se afiguram inessenciais. A opinião pública global caracteriza o contra-ataque israelense majoritariamente como “desproporcional”. Os palestinos em Gaza são identificados como vítimas juntamente com o Hamas, como se esse regime não se tivesse imposto em uma sangrenta guerra civil contra o grupo laico Fatah.

Assim a propaganda islâmica do massacre da população civil cai em terra fértil. Com efeito, o Hamas transforma, exatamente como o Hizbollah libanês em 2006, a população em refém, ao transformar mesquitas em depósitos de armamentos e permitir que seus quadros armados atirem de escolas ou hospitais. A opinião pública mundial ignora isso, pois já reconheceu o Hamas como “poder de garantia da ordem” em meio à crise social. Por isso o pragmatismo capitalista se volta, conforme se pode observar até na imprensa burguesa de orientação liberal, cada vez mais contra a autodefesa israelense. Aqui reside de resto o segredo da virada neo-estatista em meio à queda da economia global: as massas depauperadas devem ser pacificadas com meios autoritários, e para tanto serve agora até o islamismo, ainda mais se ele logra legitimar-se formalmente como democracia. Mesmo uma esquerda, que não tem mais um objetivo socialista e se jacta da pós-moderna “perda de todas as certezas”, corre o risco de identificar-se com a administração autoritária da crise e aceitar como inevitável a guerra islâmica contra os judeus, como se ela fosse um mero flanqueamento ideológico. O conflito vicário alcançou uma dimensão social no plano global. Contra o mainstream ideológico, faz-se mister constatar que o aniquilamento do Hamas e do Hizbollah é condição elementar não apenas de uma paz capitalista precária na Palestina, mas também de uma melhoria das condições sociais. Se as perspectivas para tanto são ruins, são boas para a desagregação da sociedade mundial na barbarização.

Traduzido por Peter Naumann




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